5.7.08

Velhos caubóis não choram

- Acho que acabou a gasolina!O velho carro parou no meio da noite. No céu as estrelas brilhavam como peidinhos no ar.- Você disse que tinha combustível! Você disse que o combustível daria para ir até o fim! - cobrou Toni.- Eu sei, eu sei...- Agora estamos presos nesse deserto. Estamos perdidos no meio desta estrada.- Eu pensei que daria. Eu pensei que daria para ir até o final - desculpou-se o motorista com a voz embargada.- Estamos fodidos! Estamos fodidos!- Não me culpe! - pediu Jonas.- Isto aqui deve estar cheio de serpentes... Serpentes e lagartos.- Pelo menos não está tão escuro assim... A lua está cheia e o céu está repleto de estrelas.- Foda-se a lua, foda-se suas estrelas!- Pensei que o combustível daria para irmos até o final desta estrada.- Pensou? Pensou? Olha só o tamanho deste deserto! Leva séculos para alguém passar por aqui. Como vamos fazer para darmos o fora daqui?Jonas olhou em sua volta. Viu apenas pedras, sombras e alguns arbustos. Lançou o olhar ao longo da estrada comprida como uma longa serpente infinita que se perdia no horizonte. A estrada desaparecia no meio da escuridão. Jonas olhou para o velho carro morto no acostamento da estrada. Era uma ossada, uma carcaça, um ser pré-histórico vencido pelo tempo. Não havia mais força, apenas pedras, arbustos, serpentes e lagartos como companhia.- Ei cara, você não está chorando, está? - exbravejou Toni.- Desculpe!...- Você é um homem... VOCÊ É UM HOMEM!- Desculpe! - murmurou Jonas.- Porra, e agora? Pare de chorar!...Jonas continuou chorando baixinho enquanto seu companheiro foi mijar ao lado da estrada. Jonas soluçou e passou a mão no rosto para enxugar as lágrimas que escorriam e deixavam rastros como lesmas.- Você atrairá as cobras mijando aí - disse jonas com a voz entrecortada.- O quê você está falando?- Você nunca ouviu falar? O som de mijo atrai cobras - afirmou Jonas. Seus olhos ainda vermelhos e úmidos brilhavam.- De onde você tira essas idiotices?Jonas baixou a cabeça e perdeu o olhar no chão seco coberto por pedregulhos. A noite estendia-se linda sobre os três. O carro era um ser comprido, de longa cauda que lembrava a de um enorme peixe. Um monstro aquático constituído de ferro, perdido num deserto coberto de estrelas, rodeado por serpentes, lagartos e arbustos resistentes como as pedras. Tudo parecia resistente, forte, moldados para resistir as maiores adversidades. Menos Jonas.
- Não diga que chorei - pediu Jonas.
- Tudo bem... Não direi.
- Aquele velho caubói que conhecemos disse que homens não choram - explicou-se Jonas. Ele contou-me que um homem deve ser valentão e que apenas mariquinhas choravam. O campanheiro de Jonas encostou-se no velho carro e praquejou novamente, depois puxou do seu interior um grande e viscoso catarro e lançou-o com força. Depois acendeu um cigarro, tragou e expeliu a fumaça.
- Merda! - Nós somos durões, não somos? - perguntou Jonas.
- Claro. É claro que somos - confirmou Toni.
- É isso aí! - concordou Jonas num tom entusiasmado. Somos como o velho caubói. DURÕES! - Chorar é para as mariquinhas. Apenas as mulheres e as mariquinhas choram. Nós somos DURÕES - completou Jonas, com os olhos cheios de lágrimas.
No céu as estrelas ainda brilhavam como peidinhos no ar.

Nenhum comentário: